A satisfação dos desejos justifica os meios?
Tudo bem, eu confesso: esse anúncio realmente me deixou babando. De raiva, claro. Primeiro porque ignora a singularidade de cada indivíduo, sua característica essencial de ser único e, portanto, com gostos únicos. Tenho uma sobrinha de oito anos que não come carne, sempre torceu o nariz e trancou os lábios. É vegetariana de nascença. Ora, ela mentiria se dissesse que aquele pedaço marrom não a atrai?
Ao afirmar que vegetarianos não assumem seu desejo, os publicitários do anúncio querem dizer que há uma espécie de verdade absoluta para o “gostar”? Não, acho que não são tão burros. O que querem é vender o produto de seu cliente, e, para isso, usam uma estratégia eficiente: se comprar o que te oferecem, você fará parte de um grupo, será aceito socialmente. Sempre dá certo. Do cigarro à cachaça. As mulheres, por exemplo, parecem saídas de uma mesma forma. Sob o pretexto de “se sentirem melhor com o próprio corpo”, só se diferenciam na quantidade do silicone. Na verdade, essas mulheres só se sentem melhores com o próprio corpo se ele se assemelhar o máximo possível ao vendido pela mídia.
A tática da padronização é tão eficaz que mesmo os excluídos querem convencer a maioria padronizada a mudar de lado. Para citar dois casos: 1) os homossexuais: muitos costumam dizer que só se é hetero até provar do negócio; depois, já era; 2) muitos de nós, vegetarianos. Quem já tentou convencer todo mundo a parar de comer carne levante a mão! Eu levanto as duas.
Voltemos à carne do anúncio. Outro motivo de fúria foi ter meu gosto estético subestimado. Nós, vegetarianos e vegans, gostamos de cores, principalmente das produzidas pela natureza para atiçar o paladar. Não é à toa que Adão mordeu a maçã (e não um fofo coelhinho que saltitava pelo paraíso). Agora – perdoem-me o palavreado logo num primeiro artigo – mas, a primeira vez que vi a foto, achei que fosse cocô de elefante. Não, nunca vi cocô de elefante, mas deve ser grande... Pensando bem, elefantes são vegetarianos e seus cocôs devem ter um aspecto bem mais agradável que o do cadáver da foto; além de servirem para adubar a terra. Que maravilha! Virei fã de elefante. Já pensou o tal publicitário tentando convencê-los – pobre animais – de que precisam de carne? “Vocês ainda vão ficar anêmicos, fracos e pálidos”.
Pra terminar o assunto – a carne já está cheirando mal – pergunto aos senhores publicitários: a satisfação do desejo – como quer o anúncio – justifica todos os meios? Se for assim, não se pode condenar alguém por matar um dono de BMW para roubar-lhe o carro. Afinal, o “bandido” estaria satisfazendo o seu desejo, que é ter um carro importado. (Confessem: todo mundo quer ter um carro importado!)
Vegans e vegetarianos têm outros motivos que justificam sua postura. A razão principal não é "não gostar de carnes", seja por terem gosto ruim seja por fazerem mal à saúde. É que para nós, os meios utilizados para satisfazer o desejo da gula – tortura, crueldade e violência contra animais – não justificam os fins.
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