sábado, 30 de janeiro de 2010

MOSCAS DE RUANDA

Nós, as moscas de Ruanda,
Vimos prestar nossas puras homenagens
A absolutamente toda a humanidade,
À grandeza de vossa raça nas raias do século XXI.
Agradecemos quase um milhão de corpos putrefeitos,
Temos engordado muito sobre vossos cadáveres.
Assistimos exultantes a vossos massacres nas ruas,
Igrejas, escolas, casas, hospitais (as moscas de
todos os lugares assistem a vosso espetáculo
de solidariedade e tolerância).
Hoje, nos alimentamos nas valas comuns,
Jantar mais lauto que vossos pratos vazios;
Vossos olhos remelados são mais gostosos
Que o barro das panelas quebradas.
Em júbilo, vemos a evolução do homo sapiens,
Que já nos aceita em seu corpo:
Enfim, a união pacífica entre homens e moscas.
Hoje, nessa santa terra,
Nos multiplicamos como homens em favelas,
Crescemos como o lucro do capital internacional,
Apátrida como os hutus e tutsis
em seu próprio país.
Agradecemos especialmente à ONU
(cujos médicos muito nos incomodam),
desta vez tão placidamente calma,
como se Ruanda fosse uma virgem feia que,
sem dote, ficará solteira para sempre.
O cavaleiro de capacete azul,
Tão belo e imponente,
Não desposaria noiva sem riquezas
(ouro, petróleo ou diamante).
Se a donzela feia e pobre é violentada, e daí?
Rapazes louros e bonitos gostam de faces coradas,
Negras magras não.
Louvamos vossa apatia,
E o silêncio conivente de vossas
cortes internacionais,
deixando vossos irmão às moscas,
como se fossem moscas mortas.
Mas nós, vivas, apreciamos o sangue
Que vossos brilhantes e eficientes fuzis derramam.
Assim, por tudo isso,
Nós, as moscas de Ruanda,
Não poderíamos ficar silentes.
Portanto, neste Manifesto, vos homenageamos:
Reconhecemos vossa preciosa colaboração.
Amados humanos, vinde,
Sentemos a uma só mesa, sempre.
Nós vos homenageamos:
Gratas, nós, as moscas,

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