quinta-feira, 18 de março de 2010

MANIFESTO SOBRE DIREITOS AUTORAIS

São Paulo 14 de dezembro 2009

Excelentíssimo Senhor Luiz Inácio Lula da Silva
M.D. Presidente da República Federativa do Brasil

Senhor Presidente:

Tomamos a liberdade de nos dirigir a Vossa Excelência para manifestar uma preocupação que é nossa, subscritores desse documento, e de todos os demais trabalhadores da área cultural do país: autores, compositores, artistas, produtores, empresários, advogados etc.

Desde há cerca de dois anos, o Ministério da Cultura iniciou, para discutir possíveis alterações da lei autoral, uma série de encontros, o primeiro dos quais no Rio de Janeiro, no Palácio Capanema, que foi alvo de severas críticas, fundadas no fato de que o MinC escolheu, para palestrantes, apenas pessoas da mesma linha de pensamento, sem qualquer oportunidade de debate e de confronto de idéias.

Essa possível alteração da Lei sobre Direitos Autorais não foi e não é uma aspiração da classe artística. Na verdade, qualquer proposta de alteração da Lei vigente que não esteja perfeitamente definida é vista com receio. A Lei nº 9.610, que completou apenas 11 anos de vigência, foi fruto de uma década de debates e de negociações, dos quais participaram inúmeros autores e artistas, bem como empresários e deputados e senadores, entre os quais Jandira Feghali, José Genoíno, Roberto Brant e muitos outros. Seu texto final foi saudado por todos como um grande acordo que viabilizou um texto que, se não agradava cada um, era aceito por todos.

Estava a comunidade autoral satisfeita com a Lei que, entre outros méritos, libertou o direito autoral da tutela do Estado, quando, nos meios de comunicação, algumas entidades iniciaram a fazer críticas, o mais da vezes desarrazoadas, à lei vigente no país, dizendo-a excessivamente restritiva e propugnando por uma “liberalização” do direito autoral.

Ora, uma comparação entre os textos das leis brasileiras, espanhola, inglesa, chilena e argentina mostra que a nossa lei não é mais restritiva que nenhuma outra, salvo no que diz respeito à cópia para uso próprio, ponto sobre o qual todos estão de acordo em buscar uma solução.

Curioso é que as críticas à legislação em vigor surgiram simultaneamente a um movimento que visava a incrementar a proteção a autores e artistas, ameaçados, como nunca, pela facilidade de copiar ensejada pela Internet e, em especial pela ferramenta “peer to peer”, que permite o desfrute da criação alheia sem pagamento e sem autorização.

Essas críticas, claramente, foram e são inspiradas pelos interesses dos chamados “provedores de conteúdo”, para os quais poder disponibilizar para seus clientes a criação alheia sem qualquer pagamento é algo assemelhado ao Nirvana.

Diga-se, a bem da verdade, que o MinC, ao longo desses dois anos, ampliou o número dos palestrantes, incluindo, sempre minoritariamente, pessoas com visão diferente da sua. Entretanto, diferentemente do que vem prometendo, jamais apresentou um texto de ante-projeto, sobre o qual se pudesse discutir. Lembra, é pena, a “tramitação” do projeto de que resultou a Lei nº 5.988, de 1973, de que a comunidade autoral só tomou conhecimento no dia de sua apresentação ao Congresso Nacional, com prazo de 40 dias para a votação. Mas, isso foi sob a égida do AI-5... Já a lei de 1998, foi ela exaustivamente debatida durante uma década, a partir de seu texto original, do Substitutivo do Deputado José Genoíno e dos pelo menos seis textos sucessivamente apresentados por seu relator na Câmara, até que se alcançasse um consenso.

A mais recente reunião promovida pelo MinC realizou-se neste mês de novembro, e fora prometida a apresentação de um ante-projeto, o que não ocorreu.

Senhor Presidente, os signatários da presente têm responsabilidades perante si mesmos e perante o meio cultural, e não querem que seus nomes venham a ser eventualmente utilizados para dar base a algo que não conhecem. Não seria a primeira vez que ocorreria uma declaração do tipo - “A, B, C e D foram ouvidos durante 2 anos, de que se queixam?”. Não fomos ouvidos, porque jamais existiu um texto para ser comentado.

Por tudo isso, requeremos a Vossa Excelência que não seja encaminhada ao Congresso Nacional, pelo Poder Executivo, qualquer proposta de alteração da Lei de Direitos Autorais sem que os Signatários da presente e demais Juristas, Produtores Culturais, Autores e Artistas brasileiros interessados nessa relevante questão, possam conhecer o seu conteúdo integral, refletir e debater amplamente, com responsabilidade, transparência e civilidade, todos os seus aspectos, para que as modificações do regime legal autoral, se vierem, atendam, judiciosa e democraticamente, o bem comum sem resultar na indesejada fragilização de direitos arduamente conquistados, coletivamente, nas últimas décadas, pelos autores brasileiros.

Na certeza de que Vossa Excelência não estará insensível frente a esta justa reivindicação de todos nós, aproveitamos o ensejo para renovar os nossos protestos e apreço e consideração.

Atenciosamente,


Associação Brasileira de Direito Autoral – ABDA

Jose Carlos Costa Netto
Presidente



Vice- Presidente: Dr. Sergio Famá D´Antino

Diretores: Dr. João Carlos Muller Chaves

Dra. Maria Eliane Rise Jundi

Dra. Maria Cecilia Garreta Prats Caniato

Dra.Maria Luiza de Freitas Valle Egea

Dr. Roberto Corrêa de Mello

Dr. Hildebrando Pontes Neto

Dra.Ivana Co Galdino Crivelli

Dr. Rodrigo Moraes Ferreira

Dr. Plinio Cabral – Conselheiro da ABDA

Dra. Silmara Chinelatto – Conselheira da ABDA

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